sábado, julho 15, 2006



(...) Enxerguei os confins do rio, do outro lado. Longe, longe, com que prazo de se ir até lá? Medo e vergonha. A aguagem bruta, traiçoeira – o rio é cheio de baques, modos moles, de esfrio, e uns sussurros de desamparo. Apertei os dedos no pau da canoa. Não me lembrei do Caboclo-d’Água, não me lembrei do perigo que é a “onça-d’água”, se diz – a ariranha – essas desmergulham, em bando, e becam a gente: rodeando e então fazendo a canoa virar, de estudo. Não pensei nada. Eu tinha o medo imediato. E tanta claridade do dia. O arrojo do rio, e só aquele estrape, e o risco extenso d’água, de parte a parte. Alto rio, fechei os olhos. Mas eu tinha até ali agarrado uma esperança. Tinha ouvido dizer que, quando canoa vira, fica boiando, e é bastante a gente se apoiar nela, encostar um dedo que seja, para se ter tenência, a constância de não afundar, e aí ir seguindo, até sobre se sair no seco. Eu disse isso. E o canoeiro me contradisse: - “Esta é das que afundam inteiras. É canoa de peroba. Canoa de peroba e de pau-d’óleo não sobrenadam...” Me deu uma tontura. O ódio que eu quis: ah, tantas canoas no porto, boas canoas boiantes, de faveira ou tamboril, de imburana, vinhático ou cedro, e a gente tinha escolhido aquela... Até fosse crime, fabricar dessas, de madeira burra! (...)


(João G. Rosa, Grande Sertão: Veredas, p. 72, Nova Aguilar, Rio, 1994).


terça-feira, julho 04, 2006

Empty Wardrobe


Walking
My steps are still timid
In my mouth
The taste of Savannah
And I keep the memory alive
Of the thrill in the city of stones

My suitcase
A plentiful baggage
In the wardrobe
The hangers are empty
Why can’t my soul
Yet be appeased
In this world
Which is still not my own?




Guarda Roupa Vazio

Andando
Meus passos contidos
No caminho
O cerrado na garganta
E eu com a memória de ante-ontem
Em meio à cidade de pedra

A mala
Uma bagagem repleta
No armário os cabides vazios
Onde terá minh’alma partido
Nesse mundo que ainda me falta?



Lília G M Tavolaro