terça-feira, maio 01, 2007

CRÍTICA DA RAZÃO PURA



Atrás desse muro de heras,
há uma floresta escura
onde enterrei meu coração.

Tentei buscá-lo mil vezes,
nestes últimos meses,
mas o medo m'impediu.

Sinto frio, tenho arrepio
de sair entre árvores, galhos,
orvalho, ruídos, escuridão.

E quem sabe uma coruja,
ruiva e obtusa,
irá fitar-me, a medusa,
ou cravar as unhas sujas
onde não há coração?

Melhor deixá-lo por lá,
quieto, morto, infecto,
livre dos desafetos
e também das amarguras.

Deixá-lo-ei encher da lama
e servir de abrigo às lesmas
dos insetos.
Afinal, é carne pura.

Eu, deste lado, me seco
e vôo leve, vazia,
pelas planícies do dia
iluminadas de razão.

Prefiro viver nas alturas,
apreciar as alvuras
e esquecer aquele triste
beberrão.





Samira Feldman Marzochi
Rio, 15 de janeiro de 2003.